Sempre
alguém de casa é a vela. A chama da fé. O fogo da crença.
Não
importa que os outros não pratiquem a religião, não acreditem em Deus, duvidem
de milagres, desdenhem da ressurreição, há alguém na família que rezará por
todos.
Sempre
haverá alguém fazendo vigília enquanto os demais vivem a inconsciência de seus
atos, alguém cumprindo promessas das graças alcançadas e nunca noticiadas,
alguém no escuro dos olhos fechados pela claridade dos seus afetos, alguém
protegendo a brasa da confiança com a concha das mãos.
Minha
mãe é a cera e o pavio queimando pelos filhos e os netos. Ela é a sarça
ardente, a oração interminável, a guardiã do nosso futuro, a nossa advogada da
transcendência, efetuando acordos, garantindo atenuantes e entrando com
liminares para diminuir os nossos pecados.
De
noite, ela encomenda saúde para nós, pede proteção, estabelece os turnos dos
anjos conforme os problemas de cada um.
Ela
é a provedora religiosa, aquela que põe comida na mesa da alma, que inspira a
seguir quando estamos próximos da desistência, que diz que uma janela foi
fechada para que se abra uma porta, que anuncia o sol no meio da tempestade,
que sossega o medo com a esperança.
Dobra
os joelhos para que fiquemos de pé, beija o chão para que possamos passar.
Entram
em sua súplica inclusive quem se mostra raivoso e brigado, quem não quer
conversa, quem se mantém afastado e emburrado. Não há privilégios e vaidades
pessoais na sua devoção.
Realiza
sacrifícios e renúncias silenciosamente, privando-se do que mais gosta ou atravessando
longas escadarias apesar dos oitenta anos. Nunca saberemos o que se comprometeu
em troca. Tem invioláveis segredos com o céu.
Ela
nos abençoa coletivamente, independente de nossa cabeça baixa e de nossas
ideologias.
Não
solicita nenhuma retribuição, não procura obter vantagens e recompensas. Põe o
nome por extenso dos beneficiados dentro da força do seu pensamento.
Tampouco
pergunta se desejamos algo, se precisamos de uma façanha do espírito, ela está
bem informada por onde anda o coração de sua prole. Dita e envia as cartas para
o invisível, com a sua voz sussurrada.
Permanecemos
tranquilos porque ela nos guarda.
Hoje
me acordei tenso, preocupado, aflito: e quem reza pela mãe?
Fabrício Carpinejar
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