Trocados pela internet - A geração de filhos órfãos de pais que não largam o celular.



O desenvolvimento infantil é marcado por etapas, onde cada uma possui suas peculiaridades. Em todas elas, porém, algo se destaca em comum: a necessidade de referência e segurança. Mas, o que isto significa exatamente?
Alguns dos principais teóricos da aprendizagem, como Donald W. Winnicott e Henri Paul H. Wallon, apontaram a relação mãe-bebê como um fator-chave para o sucesso do bom desenvolvimento cognitivo e emocional das crianças em seus primeiros meses e anos de vida. O período que vai dos 0 aos 5 anos, também, para teóricos como Sigmund Freud, Melanie Klein, Lev Vygotsky, Jean Piaget, constitui uma fase crucial para esse desenvolvimento.

Não se trata do desenvolvimento motor e cognitivo, apenas, mas do emocional. Referência e segurança, como dito antes, dependem do tipo de relação desenvolvida entre a criança e seus pais. Quanto mais segura afetivamente a criança se sente, protegida, amada e cuidada, melhor se torna o aparato psíquico dela diante do mundo.
Para se desenvolver a criança se espelha em referências. Os pais são a maior referência. É com base no comportamento dos pais que a criança constrói sua ideia de mundo, especialmente de relacionamentos. A autoimagem da criança, isto é, a maneira como ela se enxerga, também é reflexo da maneira como os seus pais lhe tratam.
Essa é a geração que nos últimos anos tem apresentado maiores índices de psicopatologias, suicídio, automutilação, depressão e ‘rebeldias’. Não é só a falta de referência dos pais, mas a substituição dela por outra qualquer, literalmente, já que diante da ausência da família, a criança busca se espelhar no que o mundo lhe oferece de forma fácil e rápida.
O que fazer?
Pais e mães precisam dedicar a - maior - parte das suas vidas ao momento mais crucial para a vida dos seus filhos, correspondente ao período em que a personalidade se forma e as primeiras habilidades sociais se desenvolvem. Podemos dizer com segurança que essa fase vai dos 0 aos 5 anos, sendo esse um período crítico, mas que se consolida até os 10/12 anos.
A partir da adolescência, já no início da puberdade (11/12 em diante), a lógica começa a se inverter. Os filhos querem se ver mais independentes dos pais. Eles querem se provar diante do mundo e é nessa fase que começam a ‘trocar’ os pais pelos amigos (risos). Isso é natural e necessário. É uma preparação para o mundo e algo contrário a isso não é um bom sinal.
Note, porém, que será nessa fase da adolescência que seus filhos colocarão à prova toda a herança recebida durante a infância. Os que tiverem tido boa referência e segurança, dificilmente deixarão para trás os conselhos dos seus pais, mas pelo contrário, vão utilizá-los para encarar a vida. O - bom - vínculo parental construído até os primeiros 10/12 anos de relação servirá de âncora para toda a juventude.
A maior problemática dos pais modernos parte desse ponto. Esse princípio de desenvolvimento relacional é ignorado ou rompido em determinado momento da vida. São pais ausentes durante a fase crucial do desenvolvimento cognitivo, afetivo e motor, que de repente querem se tornar presentes de ‘supetão’ mais na frente, na adolescência, encontrando rejeição (justificada) por parte dos filhos.
É preciso acompanhar os filhos no dia-a-dia desde muito cedo, não em corpo presente, apenas, mas mentalmente. Conversar, participar das atividades conjuntas, ouvir, apreciar dúvidas, experiências, valorizando erros e acertos. É preciso lançar sobre os filhos um olhar de afirmação. É o olhar que seu filho(a) sabe que você os aprova, confia e acredita em suas capacidades, mesmo quando eles erram.
Muitos pais e mães estão tão entretidos no mundo virtual que não percebem o quanto isso é importante, deixando o tempo passar, enquanto seus filhos perdem tais referências.
A falta da presença paterna/materna gera um vácuo que, aparentemente, pode ser ‘preenchido’ com entretenimento digital (pais que deixam seus filhos abandonados na frente de uma TV, do celular e outras parafernálias, horas e mais horas...), mas que vai estourar lá na frente na forma de sintomas de insegurança, ansiedade, revolta, tristeza, falta de motivação, etc.
Assim, pais e mães precisam voltar a ter contato com os filhos sem a presença da tecnologia como intermediária. Visitar praças, realizar atividades ao ar livre. Sair com outras crianças e promover interações. Tudo isso exige que você, pai e mãe, largue mais o celular. Abra mão um pouco mais de si para investir no futuro da saúde mental dos seus filhos. Acredite, se não fizer isso em tempo hábil, a conta dessa dívida um dia irá chegar.

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