O
medo é enorme, toma conta do nosso ser e cavalga em nós à base de chicotadas e
esporas. E a maior parte dos sonhos sequer saem do mundo das ideias.
“Teu
medo muitas vezes termina quando tua mente se dá conta que é ela que cria este
medo.”
Alejandro
Jodorowsky
Nós
vivemos em um mundo com um ritmo completamente alucinado, sempre com mais
coisas para fazer do que a nossa real capacidade temporal permite. Somos
cobrados sistematicamente para que consigamos dar conta – sem reclamar, é
claro, – já que somos vistos tão somente como peças dentro de uma engrenagem
que deve funcionar na máxima velocidade o tempo inteiro. Entretanto, ainda que
isso por si só já seja problemático, o pior vem a seguir: dispomos de enorme
energia em coisas que na maior parte do tempo sequer gostamos.
Obviamente,
não há como fazer tudo que queremos o tempo inteiro. A vida adulta exige um
certo pragmatismo para que seja possível o seu funcionamento. Todavia, há na
contemporaneidade um excesso pragmático, o que torna a vida burocrática até
mesmo nos pequenos detalhes. Inseridos nesse mundo de ‘máquinas’, nos sentimos
extremamente cobrados, mesmo que inconscientemente, a nos adequarmos a esse
modus operandi.
Sendo
assim, toda vez que sentimos vontade de sair da ‘linha’, por algo que fala em
nós, recebemos uma torrente de sentimentos pesados que nos bloqueiam e impedem
que saiamos do lugar; reverberando em um exército de pessoas amedrontadas,
inseguras, cheias de pressões na cabeça e, por conseguinte, paralisadas,
automatizadas e tristes.
Eu
sei que a insegurança é um traço da existência humana, afinal, somos finitos e
confusos. No entanto, o que causa ‘estranheza’ é o modo como há no sistema que
vivemos toda uma cultura para explorar ao máximo as nossas inseguranças, a fim
de que estejamos sempre em lugares previsíveis (físicos e do pensamento) e,
portanto, estejamos sempre controlados.
Há
total desestímulo a todos os que se colocam de modo diferente para o mundo, que
buscam interpretá-lo de forma original, que procuram conhecê-lo, explorá-lo,
esmiuçá-lo, principalmente, nas suas obviedades, que é o lugar em que se escondem
as grandes belezas da vida.
Mas
o medo é enorme, é gigante, toma conta do nosso ser, subordina-nos, cela-nos e
cavalga em nós à base de chicotadas e esporas. E, assim, a maior parte dos
sonhos, desejos, ambições, sequer saem do mundo das ideias, ou melhor, sequer
chegam a florescer no mundo das ideias, porque existe o medo de falhar.
O
habitual está no erro, nunca na possibilidade de dar certo, sobretudo, quando
se trata de algo fora do ‘comum’, já que somos ‘livres’, desde que façamos as ‘escolhas’
pré-determinadas por um grupo seleto de pessoas que brincam em seu teatro de
marionetes.
Dessa
forma, a nossa própria relação com o tempo se torna extremamente conturbada e
problemática, porque nós acreditamos que estamos velhos demais para fazer
alguma coisa que temos vontade, como trocar de faculdade ou fazer a faculdade
que sempre sonhamos, iniciar um projeto convencional ou ‘não-convencional’,
mudar de trabalho, iniciar um relacionamento ou novos relacionamentos (sentido
amplo); enfim, sair de um lugar que está ruim, fazendo-nos mal, que não está
nos trazendo felicidade e buscar algo que realmente queremos fazer, lugares que
queremos estar, pôr em prática ideias que circulam em nossa cabeça e sonhos que
bombeiam nosso coração.
Sentimo-nos
velhos e, não raras vezes, incapazes de realizar aquilo que queremos. Contudo,
ao contrário de permanecermos onde estamos e vivermos o presente, pensamos
sempre no futuro, tomados pela ansiedade, mas paralisados pelo medo. Também
pudera, é tanta pressão: de fora, de dentro, pressão para seguir os padrões,
para se adequar, para correr, produzir, se anestesiar... realmente, estamos
velhos demais para sonhar. Ou pelo menos, é assim que querem que pensemos e nós
estamos cada vez mais acreditando nisso como a verdade última da nossa
existência.
Desse
modo, o nosso mundo extremamente desenvolvido, está completamente nebuloso,
frio e gelado. Vivemos sem nos dar conta de que não basta viver, é preciso
navegar, nos nossos mares, nos nossos sonhos, nas nossas loucuras, porque mais
do que átomos, somos feitos de histórias, que precisam ser contadas para que
continuem vivas.
O
medo de falhar é terrível, confesso. A insegurança parece estar sempre à
espreita, também sei. Entretanto, se a vida é um caminho que se faz ao
caminhar, os sonhos são as asas que nos permitem sobrevoar as pedras que nele
aparecem. Por mais que seja difícil, a escolha entre parar e voar é sempre
nossa, já que: “Uma cabeça cheia de medos
não tem espaço para sonhos”.
Via: Caminhos