A
felicidade não precisa ser sempre povoada, e sim também tecida de
espiritualidade, inspiração, calmaria e reflexão...
Há
momentos em que a gente só consegue encontrar harmonia, equilíbrio e paz
estando só. Descobrindo que a ausência de barulho, agitação, burburinho e
efervescência nos reconecta com o que há de mais verdadeiro em nós. Autorizando
que a vida também seja feita de quietude, mansidão, doçura e serenidade.
Permitindo o encontro com as alegrias silenciosas, com o entusiasmo sereno, com
a euforia delicada.
Foi
no filme ‘Comer, rezar, amar’ que ouvi a frase: “Há momentos que temos que procurar o tipo de cura e paz que só podem
vir da solidão”. Liz, a personagem, em sua jornada de autoconhecimento,
deixa para trás sua casa, seu marido e uma carreira de sucesso para descobrir o
que é importante em sua vida. Porém, não precisamos ir tão longe para nos
reconectarmos com aquilo que nos é primordial.
É
preciso ficar um pouco só se quisermos nos conhecer de verdade. Ousar
desconectar o fio que nos liga ao mundo por alguns instantes para acessar nossa
própria autenticidade. Optar pelo silêncio, pela simplicidade e pelo
distanciamento. Aprender a ser ausência, a respeitar a necessidade de nos
resguardar, de ser menos fachada e mais discrição.
Não
defendo a solidão, pois sei o quanto é duro viver sozinho, sem um par, longe da
família e dos amigos. Já passei por isso, por noites frias em que uma mensagem
visualizada e não respondida no celular doeu, por instantes em que a melancolia
produzida pelo cálice de vinho trouxe à tona velhos fantasmas, por momentos em
que o acorde de uma antiga canção machucou.
Somente
aqueles que cresceram e amadureceram nessa vida sabem o gosto amargo da solidão
doída do abandono e da rejeição. Mas também aprenderam a reconhecer e
distinguir a outra solidão, aquela que traz conforto e paz. A solidão boa, que
não traz dor nem pesar, mas nos reconcilia com a alma cansada e permite seu
restabelecimento e cura.
É
um luxo poder desfrutar de nossa própria companhia, em momentos de solidão por
opção. Conhecer o que nos faz bem, o que nos completa, o que nos basta.
Encontrar respostas no silêncio ou recarregar as energias num banho morno, numa
xícara de chá, numa leitura agradável, num filme cheio de significado. Às vezes
as respostas que buscamos estão à nossa espera, mas ocupados que estamos com o
burburinho do mundo, não damos chance delas virem à tona.
Como
peregrinos que optam por fazer suas rotas de fé e autoconhecimento sozinhos (em
trajetos como o ‘Caminho de Santiago’), percebemos que a solidão escolhida é
muito mais que uma necessidade de não estar rodeado de gente. É a descoberta
madura de que somos seres caminhantes, e alguns percursos são só nossos, de
mais ninguém. Adiar essa possibilidade nos afasta do crescimento e da cura, e
não nos ensina a resistir nas horas mais silenciosas e desertas.
É
preciso gostar de ficar um pouco sozinhos se quisermos ser boas companhias.
Experimentar ir ao cinema desacompanhados, sentar num café apenas com um bom
livro, fazer uma refeição completa ouvindo os próprios pensamentos. Ganha-se
intimidade com os próprios gestos, camaradagem com as próprias vontades,
familiaridade com a própria individualidade.
A
gente aprende a se enfrentar ficando sozinho. Aprende a vencer o medo de ser
olhado com desconfiança (“sozinha num
cinema? Ela não tem ninguém?”), aprende a vencer os próprios preconceitos,
aprende a distinguir solitude de solidão.