“Onde
não houver amor, não se demore.”
Eleonora
Duse
Temos
muita dificuldade em colocar um ponto final e de ‘partir para outra’, nos
vários setores de nossa vida, como se fugíssemos à responsabilidade de ter de
arcar com a dor advinda com esse despedir-se, como se aquilo que está feito,
feito está, o que é uma inverdade, pois, muitas vezes, a permanência traz uma
segurança ilusória.
E
assim vamos pagando um preço alto por nossa covardia e fingimento para com ninguém
mais do que nós mesmos.
Os
caminhos que temos à nossa frente é entremeado por bifurcações e armadilhas e,
sem que percebamos, somos muitas vezes levados a optar por alternativas às
quais é mais fácil nos acomodarmos.
Acomodar-se,
porém, pode também significar passividade e conformismo, sendo que sentimentos
estanques não nos impelem às mudanças necessárias ao nosso desenvolvimento como
pessoas.
Conformar-se
demais pode nos custar a distância de uma outra verdade – com a qual nos
identificaríamos melhor - a desonestidade com nossas vontades e um crescente
arrependimento, nocivo tanto ao nosso bem-estar quanto à harmonia com quem está
ao nosso lado.
É
necessário dizer adeus ao amor que já deixou de acelerar nossos corações, que
já não sorri quando nos vê, que não nos dá as mãos, pois não caminha ao nosso
lado, que não nos pergunta se dormimos bem, se almoçamos, ou o porquê das
lágrimas suspensas em nossos olhares distantes.
É
necessário despedir-se do amor que trai e fere, que já nem é amor, nem amizade,
nem troca ou cumplicidade, tampouco conforto e necessidade.
Digamos
adeus à amizade que já deixou de fazer falta, que não tem tempo de nos ouvir e
animar, que já não aparece em busca de conselhos, nem quer saber de nossas
vidas.
É
preciso despedir-se de amizades que não acrescentam, que nos diminuem, que nos
trocam facilmente, que usam nossos segredos contra nós, puxam nossos tapetes,
esgotam nossas energias.
É
necessário dizer adeus ao serviço que nos empobrece, que alimenta nossa miséria
emocional, que nos impede de sorrir, que não nos oferece oportunidades, que nos
assedia moralmente, não nos ouve.
É
necessário despedir-se dos chefes desumanos, dos colegas de trabalho
hipócritas, das jornadas extenuantes, da mesquinharia com o cafezinho, dos
gritos e erros destacados, da humilhação velada, da estagnação que anula nossas
capacidades, da cordialidade venenosa na mesa ao lado.
Digamos
adeus ao lar que já não nos comporta em tudo o que somos e queremos, que
extrapola os nossos limites, que cobra por nos amar, tolhe nosso caminhar e não
mais entende o que falamos.
É
preciso despedir-se do quarto sem privacidade, da TV sempre ligada, da roupa
emprestada da irmã, da cópia das chaves da porta, da consulta ininterrupta ao relógio
nas noites de diversão.
É
necessário dizer adeus à esperança de que o outro vá mudar, à espera vã do
telefonema, da resposta que nunca chega, do convite que nunca é ouvido, do “eu te amo” nunca dito, do abraço não
correspondido, do olhar que não penetra fundo, do reconhecimento nunca
recebido.
É
necessário despedir-se de quem nos fere, no corpo e na alma, de quem nos
incomoda, dos xingamentos, das noites insones, da violência alheia, da ânsia
pelo fim do expediente, pelo fim do dia.
Digamos
adeus ao não existir, ao sufocamento de nossos desejos, à raiva contida, às
ofensas engolidas, aos desvios de caminhos, aos projetos não realizados, aos
sonhos que não acordam, à morte em vida.
É
preciso despedir-se das roupas que já não nos servem, dos CDs que não ouvimos,
das cartas que já nem lemos, das lembranças que nos ferem, das fotos
envelhecidas no tempo, da sombra da infidelidade, das obrigações que criamos e
não nos levam a nada.
Não
nos demoremos em lugares onde não nos sintamos vivos, amados, onde não
respiremos direito, onde não possamos ser verdadeiros. O desapego é difícil,
pois requer o enfrentamento corajoso do que fizemos de nossas vidas, do que
somos e sentimos, e encarar as escolhas erradas traz dor e culpa.
Além
disso, quando rompemos com o que parece estabelecido em nossa jornada, mexemos
também com as vidas que caminham conosco e teremos que trilhar uma árdua
batalha, até que sejamos compreendidos, ou não.
O
importante é que estaremos agindo em busca de nossa felicidade, partindo ao
encontro de nosso lugar no mundo e na vida de alguém. Ninguém pode ser
condenado por tentar ser feliz, quando o fizer de forma ética e sincera, sem
desrespeitar a si mesmo nem a ninguém mais.
Quem
nos ama de verdade acabará entendendo a necessidade de nossa atitude, torcendo
pelo nosso sucesso, onde e com quem estivermos.
Nossa
sobrevivência depende do adeus às ilusões, da coragem para iniciarmos as
despedidas necessárias, tendo a consciência de que as infinitas possibilidades
que se descortinarão a partir de então compensarão as perdas pelo caminho.
Ninguém
é obrigado a aceitar com resignação e conformismo aquilo que pode – e deve –
mudar. Todos, afinal, temos o direito de viver e de respirar com alívio, com a
certeza de que o que deixamos para trás ficou exatamente onde deveria: lá
atrás, bem distante, não tendo mais poder algum sobre nossas vidas e nossa
busca pela felicidade.
Via: Bem Mais Mulher