“Disse
a flor para o pequeno príncipe: é preciso que eu suporte duas ou três larvas se
quiser conhecer as borboletas.”
Antoine
de Saint-Exupéry
A
dimensão da existência humana vai muito além daquilo que podemos sentir ou
mensurar, tampouco compreender. Não à toa Drummond nos diz que no seu coração
sequer cabem as suas dores. A nossa finitude e incapacidade para entender
aquilo que acontece, na maior parte das vezes, nos paralisa e nos coloca diante
do traço trágico que nos forma, como se não houvesse saída, ou não houvesse
tempo o suficiente para que possamos chorar nossas lágrimas.
Quando
estamos dentro do furacão ou diante das tantas travessias a que temos que
passar, tendemos a esquecer que a vida também é constituída por transições,
ciclos, mudanças a que temos que passar a fim de que possamos crescer e
tornar-se algo mais próximo daquilo que realmente somos. São as longas e
silenciosas metamorfoses da vida, como falou Rubem Alves, e sem as quais
continuamos a ser lagartas ou borboletas sempre com as mesmas cores.
Evidentemente,
até pela nossa condição humana de finitude e, consequentemente, incapacidade de
apreender tudo aquilo que nos forma (interna e externamente), sentimos enorme
dificuldade em passar por esses momentos, o que em alguns casos pode ser até
mais desesperador, com o desenvolvimento de problemas graves, como a ansiedade
e a depressão.
No
entanto, é preciso que busquemos perceber que grandes coisas surgem de momentos
de conflito e que se estamos sob a ação de um tempo que não conseguimos
controlar, não há como lutar contra ele, tentando se apegar a momentos que já
não existem ou forçosamente querendo chegar a lugares futuros. É necessário
aprender a conviver com esse tempo, sabendo que as quedas fazem parte da vida,
assim como as transformações que delas decorrem.
Dito
de outro modo, precisamos – como versa o poema da Cecília Meireles – aprender
com a primavera a deixar-nos cortar para que possamos voltar sempre inteiros,
já que, ainda que não percebamos, sempre há galhos que precisam ser podados ou
retirados para que novos ramos possam crescer. É como na estória do Pequeno
Príncipe, em que a rosa diz para o principezinho que precisa suportar duas ou
três larvas se quiser conhecer as borboletas.
A
bem da verdade, sabemos o quanto é difícil suportar essas ‘larvas’, afinal,
somos tão pequenos diante da imensidão do universo. Entretanto, é nesse mesmo
universo que habitamos, onde a dor e o sofrimento se fazem presentes, que
também se esconde a inexplicável poesia da vida, a que encontramos se soubermos
olhar. Sendo assim, em cada travessia que fazemos se esconde uma transformação,
pois para cada coisa que morre, há sempre outra que nasce, já que “devemos morrer para uma vida, antes que
possamos entrar em outra”.
Dessa
forma, somos como rios que vão fluindo, reconstruindo-nos de modo diferente a
cada tempestade que nos abate, pois somos seres transitórios e é nessa
transitoriedade que nos encontramos. Por isso, lembrando mais uma vez Cecília –
“A vida só é possível reinventada” –
para que a cada estação possamos experimentar o vento com um novo gosto e lavar
nossa alma com uma nova luz.
Via: Conti Outra