Que gosto tem a saudade?



Te pergunto que gosto tem a saudade. A sua saudade. Porque, de tempos em tempos, fecho os olhos para não esquecer do sabor que tem a minha. Ah, a minha saudade. A minha vestia gravata e camisa branca, fazia a barba bem-feita todos os dias no espelho antes de ir para o trabalho e sempre nos dava um beijo antes de partir. A minha saudade tem gosto de maçã no café da manhã e cerveja no fim de semana.
Engraçado que a gente nunca espera que ninguém se vá. A gente fica ansioso pela volta e, quando não voltam, fica um vazio. Um gosto de vazio. Um sabor amargo de espaço não preenchido. Mas não mais. Não comigo. Porque minha saudade tem assim um gosto de perfume. E quando fecho os olhos, pareço estar num campo cheio de flores amarelas e vermelhas. E muita, muita grama em tons claros de verde. Minha saudade é assim, do campo, da terra, da fazenda, do sol e da praia. Minha saudade tem gosto de mar também, de onda forte, dessas que nos dão um caldo e nos fazem dar cambalhota.

Minha saudade me abraçava apertado e roçava seu bigode no meu pescoço. É o que mais sinto falta. Da falta de tato, da falta de jeito, do amor contido, da paixão exagerada e das palavras que não vinham. Mas era amor. Quem seria eu para dizer que aquilo não era amor? Ninguém ensina ninguém a amar. A gente simplesmente sente. A gente simplesmente faz. E ele fazia, todos os dias, mesmo que eu não soubesse disso. De ingrato, passei a sentir uma gratidão enorme por essa vida que nos faz sentir a dor da perda. Porque quem perde também ganha. Ganha um espaço que, por mais difícil que seja, pouco a pouco se preenche. Se enche de histórias. Daquela vez que víamos futebol enrolados nas cobertas na sala, ou de quando brincávamos de subir nas costas e alcançar o céu. Porque ele era gigante e me fazia chegar no teto. Ele era gigante para mim. Ele era enorme aos meus olhos, aos meus braços e ao meu peito.
E dava certo, sempre me encaixava no ombro, me levava nas costas ou segurava minha mão. Era o que eu queria ser, mesmo sem saber disso. Até quando eu o detestava, porque nem tudo era amor, eu gostei dele. Gostei tanto que gosto hoje ainda mais.
E mesmo sem sua presença para saber no que me tornei, sei que sigo um caminho que ele gostaria que eu descobrisse sozinho. A vida não nos dá um mapa, amigo. Mas nos dá tantas bússolas que, mesmo perdidos, nos encontramos. Descobri sem você aqui que nunca estarei sozinho. Por mais que às vezes pareça, essa luz nunca se apagará. Já consigo dormir no escuro, pois no meu coração existe uma chama com seu nome e suas iniciais que ilumina minha rua de sonhos.
Porque quando a dor da perda aprende a se transformar em amor, a saudade fica saborosa e só nos resta sentir. Eu sinto falta do meu pai todos os dias, mas aprendi que o amor sempre cura tudo e que, onde quer que ele esteja, estará me amando e eu o amando de volta.
E você, que gosto tem a sua saudade?

Via: Deu Ruim