Outro
dia estava num mercadinho, e uma senhorinha me antecedia à fila do caixa. Ela
lutava com sua bolsa, tentando encontrar o dinheiro para pagar a pequena compra
que fizera. Ciente da sua aparente demora em fazê-lo, comparada aos padrões
apressados que estabelecemos, ela me perguntou: “Está com pressa?”
Talvez
ela já tenha se acostumado ao nosso ritmo louco; talvez nem concorde com ele,
mas prefira não contestar.
Olhei
rapidamente para ela, já que até então só observava sua dificuldade em fazer o
pagamento. Senti-me fazendo um giro em torno do meu comportamento, até
finalmente conseguir reunir duas palavras que surpreenderam até a mim: “Não senhora.”
Talvez
tenha sido uma ousadia minha. Afinal, quem em sã consciência, nesses dias
frenéticos que temos vivido, ousa dizer que não está com pressa?
Ela
assentiu, conseguiu reunir seus trocados e se foi. Eu fiquei, refletindo comigo
pelo restante da tarde. Passei a ouvir o Lenine cantando em meus pensamentos,
como se uma verdade estivesse sendo aos poucos revelada:
“Enquanto todo mundo espera a
cura do mal e a loucura finge que isso tudo é normal eu finjo ter paciência.”
Sei
que não fingi minha paciência. Não nessa tarde. Mas vejo impaciências pouco
disfarçadas o tempo todo. Quando os motores não querem desacelerar, nem para
esperar quem precisa cruzar à nossa frente, e a buzina parece ter se tornado o
meio de comunicação mais eficaz. Quando as horas do nosso relógio importam mais
que as pessoas à nossa frente na fila; quando alguém quer ter uma conversa
tranquila e não lembramos mais como é que se faz isso; quando nossos celulares
ensandecidos, nos chamam o tempo todo.
Porque
a gente só pensa na correria e só fala disso, de como o tempo tem passado
rápido. Sem paciência pra sentar e fazer uma refeição direito, sem paciência
pra esperar os passinhos de uma criança, ou pra esperar o pedido chegar à mesa
da lanchonete.
Naquela
tarde em que percebi que a paciência anda meio escondida entre nossas virtudes,
entendi o recado que o cantor quis transmitir ao dizer que “a vida é tão rara”. E ela tem sofrido tanto, com essa nossa falta
de paciência!
Nem
sabemos mais como as outras pessoas têm passado, porque a nossa impaciência
responde ao “oi, tudo bem?”, lançando
a mesma pergunta, ao mesmo tempo, e saímos sem de fato sabermos as respostas.
Mas dificilmente teríamos parado pra escutar, caso tivéssemos ouvido um “não ando muito bem”.
Seria
ótimo se criássemos mais oportunidades para dizer: “Não senhora, não estou com pressa” (mesmo que no fundo a
estivéssemos sentindo). Porque precisamos ter coragem de resgatar esse elo
perdido com as outras pessoas, que as faça sentir valorizados e importantes,
mais importantes que a nossa correria do dia a dia.
Eu
sei que ‘a vida não para’, mas nós precisamos nos permitir de vez em quando.
Respirar fundo e se recusar a expor essa pressa que ameaça sair pelos nossos
poros. Aprender a esperar o tempo do outro sem precisar empurrar nossa pressa
sobre ele. Porque “o mundo gira cada vez mais veloz”, mas nós podemos sim ditar
outro ritmo, que seja nosso e mais respeitoso.
Isso
é o que “a gente espera do mundo, e ele
espera de nós”. Não queremos mais decepcioná-lo, nem nos inquietarmos
tanto.
Saibamos
ter “um pouco mais de paciência”. Isso
sim é urgente e inadiável!
Alessandra
Piassarollo