A
falta de confiança e a incapacidade de confiar são apenas o começo...
Durante
os anos em que pesquisei e escrevi ‘Mean Mothers’, eu falei com outras mulheres
sobre as nossas experiências em comum. A história de cada mulher é diferente;
talvez o que há de comum é a descoberta de que não estamos sozinhas, que não
somos as únicas meninas ou mulheres que tiveram mães incapazes de nos amar. Os
tabus sobre ‘desrespeitar’ os pais e os mitos da maternidade, que retratam
todas as mães como amorosas, só servem para isolar as filhas não amadas. Essa
descoberta aumenta a mágoa e as feridas, mas não se resume a isso.
O
seguinte catálogo do que pode acontecer com uma filha que cresce sem o amor e o
apoio de uma mãe não é uma pesquisa científica; não deve ser generalizado para
todos os casos. Novamente, eu não escrevi como psicóloga ou terapeuta, mas como
uma companheira de viagem.
Na
infância, a criança pega o primeiro vislumbre de si mesma no espelho que é o
rosto da mãe. Se a sua mãe for amorosa, o bebê se sentirá seguro e protegido;
ele aprende tanto que é amado quanto é amável. Essa sensação de ser amável,
digno de afeto e atenção, de ser visto e ouvido, torna-se o alicerce sobre o
qual ele construirá as suas mais profundas certezas-de-si, e fornecerá a energia
para o seu crescimento.
A
filha de uma mãe fria – emocionalmente distante, que não interage com o bebê,
ou até mesmo crítica ou cruel – aprende lições diferentes sobre o mundo e sobre
si mesma. O principal problema, é claro, é o quão dependente uma criança humana
é da mãe para sua nutrição e sobrevivência. O resultado disso é um apego
inseguro, caracterizado como ‘ambivalente’ (a criança não sabe se quem vai aparecer
é a mamãe boa ou a má) ou ‘esquiva’ (a criança quer o amor de sua mãe, mas tem
medo das consequências dessa busca). O apego ambivalente ensina à criança que o
mundo dos relacionamentos não é confiável; o apego evitativo configura um
terrível conflito entre as necessidades da criança, tanto pelo amor de sua mãe
quanto pela proteção contra os abusos físicos ou emocionais dela.
O
ponto chave é que a necessidade da criança pelo amor de sua mãe é uma força
motriz primordial, e essa necessidade não diminui com a indisponibilidade –
coexiste com o terrível e prejudicial entendimento de que a única pessoa que
supostamente te amaria sem condições, não o ama. A luta para lidar com isso é
poderosa. Ela afeta muitas, se não todas as partes do self – especialmente na
área dos relacionamentos.
O
trabalho de Cindy Hazan e Philip Shaver (entre outros) mostrou que as
experiências da primeira infância foram altamente preditivas sobre os
relacionamentos românticos e as amizades feitas na vida adulta. Não vai
surpreendê-lo afirmar que as feridas mais comuns são aquelas relacionadas ao
self e à área de conexão emocional.
Não
devemos olhar para estas feridas para se lamentar ou jogar toda a
responsabilidade por quem somos nas costas de nossas mães, mas para nos
tornarmos conscientes delas. A consciência é o primeiro passo para a cura de
uma criança não-amada. Muitas vezes, nós simplesmente aceitamos esses
comportamentos em nós mesmos sem saber o seu ponto de origem.
1.
Falta de consistência
A
filha não-amada não sabe que é amável ou digna de atenção; ela pode ter
crescido se sentindo ignorada ou criticada. A voz da sua mãe continua ecoando
na sua cabeça, dizendo que ela não é inteligente, bonita, gentil, amorosa,
digna... etc. Aquela voz materna internalizada continuará a minar suas
realizações e talentos, a menos que haja algum tipo de intervenção. Filhas, por
vezes, falam sobre o sentimento de que estão ‘enganando as pessoas’ e expressam
o medo de serem ‘descobertas’ quando alcançarem o sucesso no mundo.
2.
Falta de confiança
“Eu sempre me pergunto”, uma mulher um dia me confessou,
“por que alguém iria querer ser meu
amigo. Eu não posso evitar de pensar que há algum tipo de interesse oculto”.
Estes problemas de confiança emanam do senso de que os relacionamentos são
fundamentalmente não-confiáveis, e fluem tanto nas amizades quanto nos
relacionamentos amorosos. Como Hazan e Shaver relatam em seus trabalhos, a
filha ambivalente necessita de validação constante que a confiança se
justifica. Em suas palavras, essas pessoas “experimentam
o amor como algo que envolve obsessão, um desejo de reciprocidade e de união,
altos e baixos emocionais, atração sexual extrema e ciúme”. A confiança e a
incapacidade de estabelecer limites estão intimamente ligados.
3.
Dificuldade para impor limites
Muitas
filhas, presas entre a necessidade de atenção da mãe e a sua ausência, relatam
não conseguir impor limites em seus relacionamentos adultos. Uma boa parte das
filhas não-amadas relatam problemas em manter estreitas amizades femininas, que
são complicadas devido a questões de confiança (“Como vou saber se ela é realmente minha amiga?”). Não são capazes
de dizer ‘não’ (“De alguma forma, sempre
acabo sendo um capacho, fazendo muito, e geralmente me acabo me desapontando no
final”), ou querem ter um relacionamento tão intenso que a outra pessoa se
afasta.
4.
Dificuldade para ver o self com precisão
Certa
vez uma mulher compartilhou o que aprendeu na terapia: “Quando eu era criança, minha mãe sempre se focava em denunciar os meus
defeitos e ignorava minhas realizações. Depois da faculdade, eu tive vários
empregos, mas, em cada um deles, meus
chefes se queixaram de que eu não estava me esforçando o suficiente para
crescer. Foi só então que eu percebi que eu estava me limitando, adotando a
visão que a minha mãe tinha sobre mim no mundo”. Grande parte disso tem a
ver com tudo o que você ouviu quando criança e internalizou. Essas distorções
na forma como vemos a nós mesmos podem se estender para todos os domínios,
incluindo a nossa aparência. (“Quando eu
vasculhei minhas fotos do tempo de adolescência, olhei para aquela menina como
a minha mãe, chamando-a de ‘gorda’. Ela também me chamava de ‘mal-amada’”).
Outras filhas relataram sentirem-se surpresas quando obtiveram sucesso em
alguma coisa, assim como são hesitantes para tentar algo novo, de modo a
reduzir a possibilidade de falha. Isto não é apenas uma questão de baixa
autoestima, mas algo bem mais profundo.
5.
Atitudes escapistas
A
falta de confiança ou o medo, por vezes, coloca a filha não-amada em uma
posição defensiva, de modo que ela evita se machucar por um mau relacionamento,
em vez de se motivar a encontrar um amor estável. Essas mulheres, na
superfície, podem agir como se quisessem estar em um relacionamento, mas em um
nível mais profundo, menos consciente, o escapismo é o seu motivador. O
trabalho de Hazan, Shaver e Bartolomeu confirma isso. Infelizmente, a evitação
impede que a filha não-amada encontre o tipo de relação amorosa que ela
procura.
6.
Ser excessivamente sensível
Uma
filha não-amada pode se tornar muito sensível aos insultos, reais ou
imaginários. Um comentário aleatório pode carregar o peso de alguma experiência
da infância sem ela mesmo estar ciente disso. “Eu tive que me concentrar nas minhas reações”, disse uma mulher,
agora na casa dos quarenta anos. “Às
vezes, eu confundo o que é dito, como brincadeira ou outra coisa, e acabo me
preocupando até me abalar e perceber que a pessoa realmente não quis dizer nada
do que havia imaginado”. Elas tendem a pensar demais e ruminar muito as
situações ruins.
7.
Replicar o vínculo com a mãe nos relacionamentos
Infelizmente,
tendemos a ser atraídos pelo que já sabemos – aquelas situações em que, apesar
de representarem momentos de infelicidade, não deixam de ser ‘confortáveis’,
por nos serem familiares. Isto, às vezes, tem o efeito de replicar, de maneira
não-intencional, a relação maternal. “Eu
me casei com a minha mãe, com certeza”, diz uma mulher: “Ele aparentava ser completamente diferente
da minha mãe, mas, no final, acabou me tratando da mesma maneira. Como a minha
mãe, ele alternava entre a indiferença e a atenção, às vezes fazia críticas
horríveis, depois demonstrava alguma forma vaga de apoio”. Ela acabou se
divorciando do seu marido e de sua mãe.
Com
esta lista em mente, o dia em que uma filha faz um balanço de suas feridas é o
primeiro dia de sua cura e sua jornada para uma nova autoconsciência e
possibilidade. Vamos brindar com a cura e com todos os amanhãs!
Via: Psiconlinews