Não,
eu não concordo com essa grosseria toda, não. Esse negócio de achar que
truculência e competência são a mesma coisa, esse estrabismo de enxergar
eficiência onde só há intolerância, essa história de aceitar e elogiar a
grosseria em nome do resultado. Para mim, não dá. Eu não aceito.
Vão
me desculpar os autointitulados ‘sinceros’, mas cuspir nossas verdades pessoais
na cara dos outros assim sem mais, sem pedir licença, sem jeito e sem pudor não
é sinceridade. É falta de educação mesmo. Pretexto para humilhar, subjugar e
acabrunhar alguém que, em nossa lógica perversa de autoproteção, precisa ficar
em seu lugar.
Quase
sempre, na esteira de um dissimulado “desculpe
a sinceridade” vem uma enxurrada de afrontas, preconceitos e ofensas
proferidos com falso desprendimento. A cada crítica forçada e opinião venenosa,
o sujeito muito orgulhoso de sua ‘sinceridade’ pisa com selvageria disfarçada
as cabeças de suas vítimas enquanto festeja sua ‘personalidade forte’. E eu
aqui me pergunto se isso não passa de fraqueza de caráter, insegurança profunda
e essas coisas que ninguém assume.
Tem
até quem ofenda e magoe alguém com a desculpa de tentar ajudá-lo. Balela.
Mentira. Não está ajudando. Truculência não é boa intenção. É mal gosto mesmo.
Digamos a verdade com firmeza, mas com doçura. Por que não?
Sim,
senhor! É claro que se pode ser sincero sem ser agressivo. Todos podemos
declarar nossa versão da verdade sem vociferar e agredir. Mas tem gente por aí
acusando pessoas de bom senso e almas cuidadosas de hipocrisia, frescura,
falsidade e outros acintes pelo simples fato de elas ainda usarem o tato e a cautela
para lidar com os outros.
É
estranho, mas a incrível inversão de valores que nos assola transformou em ‘fingido’
o sujeito de bons modos. Reduziu à condição de ‘sonso’ o cidadão que ousa dizer
o que pensa com firmeza, sim, mas com toda a delicadeza que lhe cabe. Na ótica
míope dos hostis, o ser gentil é um molenga, um banana e um fingido. E a gentileza,
veja só, é uma farsa.
Uma
coisa é a nossa dificuldade de ouvir ‘a verdade’ alheia, nosso embaraço em
aceitar críticas e receber opiniões diversas. Isso se trata e se corrige. Outra
coisa é o nosso direito de ouvir o outro com o mínimo de jeito e delicadeza. Isso
não se negocia.
Sigamos
assim, exaltando os grosseirões autointitulados ‘sinceros’ e julgando como
hipócritas, frouxos, covardes de personalidade fraca os bem-educados, e
estaremos cada vez mais distantes uns dos outros, rolando ladeira abaixo no
caminho para o nada.
Nessas
horas eu sinto saudade de minha bisavó, Benedita Rosa, que me visitava com a
brisa da tarde, na Hora da Ave Maria, Hora do Ângelus, ‘Hora da Rosa’. Pensar
nela me faz bem. Olhando em nossos olhos durante uma bronca, tinha a firmeza e
a direção das locomotivas. Mas nunca perdeu a doçura dos anjos e dos sonhos de
padaria. Valei-me, Vovó. Valei-nos Deus! Com toda a sinceridade, está faltando
sua gentileza aqui embaixo.
Via: O Segredo