A simplicidade da vida.



Era um trabalho para a escola. Dois vasos, três grãos de feijão em cada um. A mesma terra, o mesmo adubo, a mesma irrigação. A diferença, na claridade: um dos vasos repousaria no escuro; o outro, na luz.
Dia após dia, meu menino e eu observávamos o desenvolvimento dos grãos. Mesmo sem fotossíntese, sabíamos que algum crescimento seria possível no vaso do escuro. Porém, ainda assim, diariamente nos surpreendíamos com a valentia do grão que, em total ausência de claridade, resistia e rompia as fronteiras na terra, subindo em direção a alguma luz que ele supunha existir fora dali, com o caule branco e algumas folhas bem desbotadas, levemente esverdeadas.

Paralelamente, no vaso da claridade, nada ocorria. Afofávamos a terra com nossas mãos invasoras, tentando facilitar as coisas para os grãozinhos preguiçosos, conversávamos com eles, aguávamos com cuidado... em vão. Após cinco demorados dias e já sem esperança, demos a mão à palmatória e entendemos que o vaso da luz não daria à luz...
Porém, muito mais que aprender sobre fotossíntese, a simplicidade da vida veio trazer entendimento sobre a complexidade dela.
E o que eu poderia dizer ao menino que esperava em vão por suas plantinhas muito, mas muito verdes?
Que não tinha dado certo, ele já sabia. Mas talvez precisasse entender que de vez em quando a gente é obrigada a se render. A aceitar o improvável, a se conformar com o que não é óbvio, mas ainda assim tem força para acontecer.
Durante a vida, muitas plantas irão florescer em lugares improváveis, sobrevivendo em meio a construções, despontando valentes por entre calçadas de cimento, desafiando a aridez do concreto, suportando a falta de vida do terreno, resistindo às intempéries da jornada. Outras, tão desejadas e cuidadas, não passarão de sementes acanhadas, inexplicavelmente covardes a voos mais altos.
Não basta desejar, meu menino. De vez em quando querer não é o bastante para que as coisas aconteçam. E mesmo que a gente fique tentado a comparar, dizendo “não é justo, ali não merecia haver vida e aqui sim...” ou: “eu queria tanto que desse certo...”, nem tudo está sob nosso controle, e comparações são perda de tempo quando se trata de natureza ou sentimentos...
Então o negócio é aceitar. E depois quem sabe, tentar de novo.
Foi o que fizemos. Dias depois, certos de que não havia mais o que esperar, trocamos a terra, escolhemos outros grãos na despensa, realizamos novo plantio. Em três dias nossos novos pés de feijão despontaram valentes, muito verdes, cheios de folhas. O experimento durou mais uma semana e hoje, feliz da vida, entregou os dois vasos à professora.
Essa experiência, meu filho, não termina aqui. Pode ser que daqui a alguns anos você perceba que não há nada de simples em recomeçar. É difícil e doloroso entender que um tempo chegou ao fim. Vivemos de esperanças; como você, do alto dos seus sete anos me pedindo para esperar mais um dia antes de tirar a terra do vaso - desistindo de suas sementes que não germinaram - e começar de novo. É normal olhar o canteiro com as sementes que não brotaram e rezar em silêncio para que alguma vida surja ali. Negociamos, barganhamos silenciosamente com Deus para que faça um milagre, que permita que aquela - exatamente aquela - semente dê frutos. Mas sabe, nem sempre acontece. Então de vez em quando é necessário aceitar que nossa hora passou. Que daquela terra não brotará mais nada. É um choque de realidade, eu sei; mas só assim acatamos o que é verdadeiro.
Só assim temos disposição para o replantio.
Só assim temos coragem de olhar pra frente - de que jeito for.