“Ninguém
merece as tuas lágrimas, mas quem quer que as mereça não te vai fazer chorar”.
(Gabriel
Garcia Márquez)
Um
dos melhores conselhos que nossos pais nos transmitem, quando somos pequenos, e
que deveríamos carregar pelo resto de nossas vidas é: “engole esse choro!”. Embora, na época, eles pudessem visar a
outros objetivos, em contextos específicos, ao nos mandar parar de chorar,
mesmo assim já estavam nos preparando para que nos tornássemos pessoas mais
fortes, seguras, capazes de enfrentar as rasteiras que a vida não cansaria de
nos dar desde então, sem sucumbirmos às frustrações e perdas, sem nos tornarmos
vulneráveis diante de quem está à espreita, esperando para usar nossas
fraquezas contra nós e em proveito próprio.
Somos
humanos, sim, e sensíveis, suscetíveis a momentos de fraqueza emocional e
tristeza, melancolia. Chorar é preciso, pois as lágrimas recobram as energias,
minimizam o mal-estar, aliviam o sufoco, limpam as impurezas da alma, desafogam
o coração. Mas, ao mesmo tempo, as lágrimas expõem nosso lado mais vulnerável,
nossa tão característica carência humana, e por isso mesmo podem ser vistas
como fraqueza por quem, naquele momento, não quer – nem nunca será capaz de –
ajudar ou, pior ainda, por quem usará aquilo contra nós mesmos, oportunamente.
Então, dependendo de onde e com quem estiver, engole esse choro!
Ao
ouvir “eu não te amo mais”, “estou partindo”, enquanto o outro
arruma as malas para sair de casa. Nesse momento, ele já decidiu viver a
própria vida longe de nós, já decidiu que tudo o que oferecíamos não bastava,
não foi suficiente. Provavelmente já encontrou quem aparentemente ofereça o que
ele esteja querendo e está forte o suficiente, visto ter tomado uma decisão.
Assim, nossa fraqueza, se exposta, somente irá aumentar, enquanto o outro se
fortalece ainda mais, bem ali na nossa frente. Engole esse choro!
Quando
o chefe, um colega de trabalho ou um cliente elevam a voz, são deseducados,
ríspidos e aparentemente injustos. Às vezes explodimos mesmo, justamente com
quem não merece, além de existirem pessoas que não sabem agir de outra forma
que não esbravejando indelicadamente, pois parecem desconhecer mínimas regras
de convivência. Por serem incapazes de se colocar no lugar do outro, não
entenderão nossos sentimentos, tampouco mudarão seu jeito de ser. Poderemos nos
colocar no momento certo e deixar claro que aquela atitude nos desagrada,
demonstrando firmeza – sempre com ar seguro, nunca com voz trêmula, jamais
diminuídos em nossa dignidade. Engole esse choro!
Se
for surpreendido por uma atitude que nunca esperaria do amigo em quem tanto
confiava, sentindo-se traído, exposto, aquebrantado, humilhado. Você foi
iludido e usado, mas não foi ingenuidade sua e sim antiética alheia.
Distancie-se, o mais longe possível; por mais que doa ter que tirar de nossas
vidas alguém de quem tanto gostávamos, é necessário fazê-lo, sem hesitação, sem
titubear – sofrer, só se bem longe dele. Engole esse choro!
Escutando
o que jamais esperava dos filhos, decepcionando-se com as atitudes e
comportamento deles, percebendo que não parecem se sentir bem perto de você. No
calor das emoções, eles dizem que nos odeiam, que somos os piores pais do
mundo. Irão, em certo momento, se envergonhar de nós na frente dos amigos, irão
querer que não apareçamos em seus quartos e não compartilharão nada de suas
vidas conosco. Tudo isso passará e retornarão ao nosso abraço que tanto os
conforta, desde pequeninos. Porque já fomos e sempre seremos seu porto-seguro,
o alento revigorante quando precisarem – não esmoreçamos. Engole esse choro!
Enquanto
segura as mãos de quem ama e está doente, sofrendo dores, passando por
tempestades da alma, enfrentando algum revés aparentemente sem solução. Quem
sofre quer nada mais do que alguém que o entenda e mantenha-se forte, porque as
próprias forças esvaíram-se e a segurança alheia então é tudo a que se pode
agarrar, para não ruir definitivamente por dentro. Mantenhamos as mãos firmes,
as palavras serenas e os olhos secos, mas cheios de esperança. Engole esse
choro!
No
momento em que se despede do filho que vai procurar o seu próprio lugar no
mundo. É preciso deixá-los ir, aconselhando-os a não olhar para trás, a não
titubear. Todo mundo merece se encontrar a seu jeito, experimentando novos
lugares, novas companhias, novos amores. É preciso ajudar a fazer as malas e a
abrir as perspectivas de vida dos filhos, incentivando-os ao descobrimento de
si mesmos, não importa se do outro lado do globo. Temos que acenar firmes e
altivos durante a despedida, pois é disso que eles precisarão enquanto se
desprendem da zona de conforto tão nociva ao aprimorar-se contínuo a que todos
temos direito. Engole esse choro!
Ao
contrário do que possa parecer, não se trata, aqui, de se tornar insensível, de
endurecer o coração, tampouco de abafar ou enganar os próprios sentimentos.
Somos sujeitos a momentos de tristeza e escuridão, em que as lágrimas são
sempre bem-vindas. No entanto, poucos merecem partilhá-las e nos verem perdidos
em nossas fraquezas, pois em nada ajudarão, nem ao menos tentarão nos estender
as mãos. Ninguém merece desnudar-se física e emocionalmente em frente a quem
não se entregará de volta verdadeiramente. Ninguém haverá de ser menosprezado
enquanto junta seus cacos emocionais. Da mesma forma, ninguém haverá de receber
lágrimas quando estiver pedindo força e motivação. Portanto, tranque as portas
e feche as janelas antes de chorar.
Sempre
será necessário cair ao chão de nossas tristezas e fracassos, gritar a revolta
da incompreensão e maldade alheias, encarar as colheitas de nossas escolhas
equivocadas, atravessar a escuridão da saudade por quem não mais voltará. Mas é
preciso que quem esteja ao nosso lado, nesses momentos, mostre-se sinceramente
disposto a nos resgatar de volta com vida e fortalecidos. Alguém que conhece e
tem certeza de que somos muito mais do que pensamos ser, que venha correndo
quando precisarmos e não saia de nosso lado enquanto não secarem nossas
lágrimas. São poucos os que merecem assistir ao nosso pranto, sem fazer mau uso
disso tudo. Ademais, no fim da vida, muito provavelmente estaremos contando
somente com nós mesmos e então saberemos lidar com nossas dores sem precisar de
ninguém mais. Enfim, lembremos sempre aquele conselho ouvido em nossa infância,
porque, em certos lugares e diante de certas pessoas, ou engolimos o choro, ou
o mundo nos engole.
Via: Conti Outra
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